Para quem é emigrante a Páscoa significa regressar à terra, nem que seja por poucos dias, para matar as muitas saudades que se acumulam desde o Natal.
Também nós tínhamos viagem marcada, mas a pandemia mundial da Covid-19 trocou-nos as voltas.
Todos os voos internacionais de e para Cabo Verde foram suspensos, como medida preventiva. Nós fomos confrontados com o dilema de aceitar o repatriamento ou ficar nas ilhas.
Pesaram as responsabilidades profissionais e o facto de, por aqui, ainda estar tudo relativamente calmo em relação ao exponencial aumento de casos na Europa.
Ficamos cá, mas com o coração dividido.
Em Portugal estão pais, irmã, sobrinhos, primos, tios, muitos amigos de infância. Estão todos os que queremos ver bem e seguros.
Ser emigrante em tempos de pandemia é vivê-la ao ritmo de dois países.
Acompanhar as notícias, as estatísticas, o aumento de casos, o número de vítimas, em Portugal, ao mesmo tempo que se vive o nosso próprio drama do lado de cá.
Brigamos com os pais que resistem a permanecer em casa. Damos todo o tipo de recomendações à distância. Sabendo, no entanto, que somos impotentes, que nada podemos fazer a não ser cuidar de nós e acreditar que eles, também se cuidarão.
Depois, permitam-nos ser ligeiramente superficiais 😊 o nosso stock de coisas boas de Portugal está a chegar ao fim.
Normalmente contabilizamos o que trazemos para chegar até à próxima viagem. Por isso, agora, já começamos a sentir falta de “23 quilos à justa” de bacalhau, enchidos, queijos e frutos secos.
E o pior! É que nem sabemos quando o poderemos repor…
Por cá, vamos vivendo a pandemia em “semi” quarentena, no nosso caso muito pouco domiciliária, por causa dos compromissos profissionais.
Trabalhar num programa de informação, implica estar na linha da frente desta história que tem de ser contada.
O país está, no entanto, obrigado a confinamento. As escolas estão suspensas, a maior parte dos serviços também, o que nos obriga a reorganizar rotinas.
Passamos parte do tempo em casa, em teletrabalho, dividindo-o com as tarefas domésticas, o apoio aos estudos do nosso filho, a cozinha, as fugazes idas às compras.
A tecnologia dá uma ajuda nalgumas tarefas, como por exemplo o pilates, tão imprescindível no bem estar físico da Soraia!
O tempo que resta passa-se online com os nossos do lado de lá. Pergunta-se mil vezes a mesma coisa “-ficaste mesmo em casa hoje?”, recomenda-se outras mil “Fica em casa, tem juízo!”, e quando se desliga espera-se que a mensagem tenha passado,
A pandemia veio mostrar-nos que por mais sólidos que nos pareçam os nossos planos eles são de uma imensa fragilidade quando confrontados com algo imprevisível.
Esperar, adiar e nada planear tornam-se palavras de ordem perante a nossa pequenez e impotência.
Somos agora, emigrantes em tempos de pandemia… sem agenda, sem data para regressar a Portugal… sem ideia de quando o poderemos fazer de novo. Em stand by.
Resta-nos repetir a frase do “arco íris”, mesmo sabendo que nem sempre tudo vai ficar bem.
Que nada pode ficar totalmente bem quando quase 100 mil pessoas já perderam a vida em pouco mais de três meses. Quando o mundo estagnou e sobre ele irá cair uma das maiores crises económicas de sempre. Quando todos teremos de recomeçar devagarinho, como quem começa a andar de novo.
Sim, nada será igual depois disto.
Mas é preciso acreditar. E quando se está longe de uma boa parte do nosso coração é preciso, mesmo, dizer bem alto: Vai ficar tudo bem… tem de ficar.