Estudou Design de Comunicação mas o destino obrigou-a a levantar voo. Já viveu em 6 países, visitou mais de 60, mas Portugal será sempre o seu primeiro amor. Apresentamos-lhe Mafalda Barreto.

Nome: Mafalda Barreto

Origem: Braga

Residência: Emirados Árabes Unidos

Profissão: Hospedeira de Bordo

Países onde já residiu: EUA, Polónia, Inglaterra e Espanha

Em linhas gerais quem é a Mafalda? 

Sou uma mulher sonhadora e curiosa. Sempre fui, desde pequenina. Tenho a curiosidade na ponta dos dedos, como diz a minha mãe. Sou determinada, persistente, ambiciosa e muito teimosa e não gosto de deixar nada a meio.

Gosto de aventura e a mudança nunca me assustou por isso talvez estar sempre a saltitar à procura do melhor para mim em cada altura da minha vida.

Mafalda Barreto

Ter vivido em tantos lugares fez certamente de mim uma pessoa mais aberta a outras culturas. No geral, sou uma rapariga normal, à procura do seu lugar no mundo. 

Viajar está-lhe no sangue? Quando começou a sentir isso?

Acho que sim, viajar sempre esteve no meu sangue. Mas acho que a grande paixão de viajar veios com a primeira vez que saí sozinha do país para um intercâmbio de trabalho voluntário num campo de férias nos EUA.

Com 19 anos, uma mala pequena, cheia de medos e incertezas, mas também de sonhos, e com as lágrimas a escorrerem-me pela cara durante as 11 horas de avião, senti que algo novo tinha nascido em mim.

Mafalda Barreto

Saí nesse dia de Portugal sem saber que seria para não voltar, sem ser por breves passagens de férias. Fez precisamente agora 12 anos que não vivo em Portugal. Depois de viver em 6 países diferentes, 65 países visitados e mais que explorados, posso dizer que viajar é mais do que um hobby mas sim a minha maneira de ver e viver a vida. É a minha essência. 

O que é que a marcou mais nos países por já onde passou?

A diferença cultural de todos os países. As pessoas, a gastronomia, os costumes e a diferente forma de ver o mundo de cada pessoa que conheci até hoje. O patriotismo dos EUA, o peso da história da segunda guerra mundial na Polónia, o papel que a Monarquia ainda tem na Inglaterra e na Espanha e agora nos UAE o contato com a religião muçulmana foram e são algumas das coisas que sem dúvida me marcaram.

A meio percurso teve de fazer uma mudança profissional.

Sim tive. Antes de sair de Portugal estava a tirar o curso de Design de Comunicação nas Belas Artes do Porto e surgiu a tal oportunidade de passar o verão nos EUA depois de terminar o meu segundo ano de curso. Mas ao mesmo tempo antes de partir candidatei-me a Erasmus para o ano letivo seguinte para a Polónia.  Voltei a Portugal dos EUA e parti rumo à Polónia. Viagem que seria para ser somente de 9 meses mas que se tornou em 2 anos. Acabei por terminar o curso lá. Queria tanto ficar na Polónia que concorri a uma bolsa de estágio Leonardo da Vinci e consegui. Comecei a trabalhar mas a minha bolsa foi cancelada por falta de fundos do Governo Português. Sem dinheiro e com um turbilhão de sentimentos não podia continuar o estágio sem ser paga mas também não conseguia ficar parada. Tentei tudo, enviei mais de 500 currículos para estúdios de Design mas devo ter recebido um par de respostas e a dizer que não. Foi assim que concorri para a Ryanair. Nos primeiros anos não foi uma transição fácil mas cresceu em mim outra paixão. Faz exatamente 10 anos que estou na aviação. Voar tornou-se num vicio tal que foi difícil parar.

Foi assim que comecei a mandar currículos para o Médio Oriente e depois de duas tentativas falhadas com a Emirates, a Etihad Airways abriu-me as portas. E aqui estou eu, faz 5 anos. 

Mafalda Barreto
Hospedeira de bordo Ethiad


O que mais a apaixona na profissão de hospedeira de bordo?

É difícil descrever a paixão de voar. O contato com as pessoas, estar em lugares diferentes num espaço de horas. Os horários estranhos que vamos ou vimos do trabalho, mas que no final tudo compensa. Pelos benefícios de viajar e de ter experiências no mundo que noutra profissão não o teria. Ter descontos em viagens em quase todas as companhias de bandeira. Comer os teus pratos favoritos diretamente do país de origem, ter aquele produto de cosmética que adoras que só encontras na Coreia do Sul ou no Japão, cortar o cabelo e fazer a manicure nas Filipinas porque é mais barato, fazer uma massagem na praia na Tailândia ou simplesmente poder caminhar num lugar diferente todos os dias.

Vê muitos portugueses a chegar aos Emirados? Que expectativas lhe parecem que têm? Seja de visita ou para viver?

Cada vez somos mais. Para visitar vêm na expectativa de ver luxo. Prédios altos, riqueza e carros topo de gama. Para viver vêm com perspetiva de um nível de vida melhor. De se concretizarem profissionalmente. Mas acho que falo pela maioria de nós estrangeiros, nós sentimos os UAE como algo temporário, de passagem. Apesar de estar aqui faz 5 anos não me vejo a viver aqui muito mais tempo ou a criar raízes ou família.

Há um grande choque cultural para uma mulher ocidental nos Emirados?

Senti algum choque sim quando me mudei para cá faz 5 anos. Era tudo diferente daquilo que estava habituada até então. Um pais árabe com uma religião diferente, que conhecia muito pouco. Onde o mundo ainda era maioritariamente dos homens e as mulheres ainda eram olhadas como um ser inferior. Fazia-me confusão ver mulheres completamente tapadas, por vezes em que nem os olhos conseguíamos ver. Mas agora posso dizer que sinto uma diferença gigante em tao pouco tempo. Não sou hipócrita ao ponto de dizer que já não há machismo, porque ainda há infelizmente, mas tal como ainda há em Portugal ou noutro país qualquer. Agora posso dizer que tudo aquilo que os media passam sobre os UAE, é mais propaganda do que o que realmente se passa aqui. Hoje em dia já são um país muito mais aberto a tudo ocidental e já não são tão restritos, mesmo durante o Sagrado Ramadão. Sinto que lentamente nos começaram a aceitar e às nossas escolhas. 

Que relação mantém com Portugal?

Ainda é o meu primeiro amor e sempre estará no meu coração. Foi onde cresci e onde aprendi a ser quem sou na minha essência. Ainda tenho muitos amigos de infância que revejo sempre que vou de férias e sou ligada muito à minha família. Falo praticamente todos os dias com eles.

Planeia regressar?

Cada vez mais sinto falta do meu primeiro amor. Gostaria de criar novamente raízes e talvez família no país que ainda tanto amo. Mas são muitos sentimentos à mistura pois criei hábitos que não sei até que ponto Portugal me vai satisfazer. Há muitas incertezas ainda. Mas tenho pensado cada vez mais em voltar. 

A minha mala leva…

Enchidos, bacalhau, azeite e vinho.

Sobre os Emirados:

Que recomendações faria a portugueses interessados em emigrar para os Emirados Árabes?

Recomendo vir visitar o país antes de decidirem e de falarem com portugueses que cá estão para saberem as suas experiências. Somos uma comunidade pequena mas temos grupos no Facebook que dão sempre algum apoio quando se quer mudar para um lugar novo. 
Diria para terem uma mente aberta sobre a religião muçulmana e sobre o país porque nem tudo que se lê nos media é verdade. Mas também para não se deixarem deslumbrar pelo luxo e virem com os pés bem assentes na terra. 

É um pais com um custo de vida elevado? Dê-me alguns exemplos.

Sim é, mas também se consegue viver com menos dinheiro se se souber controlar e se se souber onde ir. Mas sem dúvida que se ganha mais, mas também se gasta muito mais. Um Estúdio/T1 pequeno pode custar 20 000 euros anuais. Para pequenos serviços como ir ao cabeleireiro, manicure/pedicure o preço consegue ser o dobro ou o triplo do que se pagaria em Portugal. Um café expresso custa cerca de 3.5 euros. Uma garrafa de vinho que custaria 2€ em Portugal poderá custar 10€ aqui. 
Mas ao contrário de Portugal a gasolina é mais barata que a água e consigo encher o tanque do meu carro (51L) por 25 euros. Já uma garrafa de água local de 0.5L não custa menos de 1.5 euro e nalguns restaurantes cerca de 5 euros.

Para quem queira ir de visita, que lugares são obrigatórios?

A Grande Mesquita de Abu Dhabi é lindíssima, os dois Palácios, o Emirates Palace, agora um hotel de luxo e o Palácio Real Qasr Al Watan que abriu ao público recentemente. O Museu do Louvre, também aberto há 2 anos, não tanto pelas exposições mas pelo edifício em si. A Corniche que é como um paredão ao longo da praia mesmo no centro da cidade. Já no Dubai visitar o maior prédio construído até então, o Burj Khalifa. O shopping Dubai Mall com uma queda de água dentro do edifico, um Aquário gigante e um show noturno de água e luzes num lago.  A Kite Beach, a praia onde se tem uma vista privilegiada do Burj Al Arab, o hotel com 6*. Os mercados antigos no Dubai Creek e fazer a travessia de barco que custa 50 cêntimos. Madinat Jumeira, um souk (mercado) novo e mais moderno. E por fim uma área de praia nova que adoro que se chama La Mer, onde tudo foi construído novo, de raíz, mas a imitar fábricas abandonadas com restaurantes e lojas e com uma praia pública ótima. 

Há algum local onde se “sinta” a cultura portuguesa?

Felizmente nos últimos 3 anos lentamente foram abrindo vários cafés onde podemos saborear vários doces portugueses e algumas comidas. Restaurantes ainda não são muitos, somente dois em Abu Dhabi e agora o chefe José Avillez abriu um novo restaurante no Dubai chamado Tasca, que ainda não tive oportunidade de experimentar mas que já está a ter muito boas críticas. Mas já posso dizer que um bom pastel de Nata, um cafezinho português;  um bacalhau ou um frango assado não me faltam. Recomendo sem dúvida o Nata Lisboa, o Al Ulya, o Nattas e o Mr.Chicken em Abu Dhabi.